LIDAR COM O DESAGRADÁVEL

"Positividade tóxica é uma dessas instituições sociais modernas que produzem imensa pressão sobre o indivíduo para que este se mostre sempre otimista ou pelo menos pareça feliz, independentemente das circunstâncias. Ela se baseia na crença de que pensamentos negativos devem ser evitados a qualquer custo" (Pedro Kupfer).

    Darei início ao nosso texto com essa definição de positividade tóxica, de Pedro, para que você, pessoa querida, leitora, leitor, não se sinta induzida, induzido a pensar que a vida é tolerar o que é desagradável, a proposta do texto não é essa, de verdade. A proposta do texto é levar a um conhecimento que não é do senso comum, só tive contato com ele a partir do estudo da filosofia do Yoga, e que quero partilhar com você, para que você possa viver melhor e seu próprio caminho. 

    Para o entendimento adequado desse movimento que denominei como "lidar com o desagradável" é preciso entendermos alguns "degraus" que o constitui:

A- Quanto mais fujo do reconhecimento daquilo que é desagradável, mais o fortaleço; 
B- Reconhecendo o desagradável, podemos conhecê-lo;
C- Conhecendo o desagradável, podemos lidar com ele, caso não seja possível afastar a possibilidade da convivência; 
D- Somente reconhecendo o desagradável, há chance de afastá-lo com efetividade, caso sua conclusão seja de que não seja justo conviver com ele;  

Vamos aprofundar a reflexão de cada ponto, para chegarmos a clareza pouco a pouco, sem pressa. 

A- Fugir do desconforto é negar o contato mínimo que é preciso para reconhecê-lo como algo desagradável e , portanto, tomar uma posição diante desse contato. Seja o desconforto esteja em uma sensação, emoção ou  pensamento, seja no contato mínimo ou de intimidade com uma pessoa ou em um contexto complexo que você esteja vivenciando no seu trabalho, por exemplo, você precisa aceitar que ele existe, para que seja possível fazer algo com ele. Caso você não faça esse movimento inicial, aquilo que é desagradável vai lhe acompanhar por mais tempo e vai aumentando sua força, na verdade, não é possível fugir dele e a intensidade maior é para gritar para você que ele precisa ser olhado. 

Seguindo uma continuidade com o texto anterior, digamos que você passou por uma falência de seu negócio, o que já foi um "sucesso", agora é "fracasso", visto isso de forma superficial. Você tentou mascarar esse fracasso, simulando nas redes sociais a mudança de uma marca para outra, para tentar fugir dele, socialmente. Só que uma pessoa envolvida com o mesmo negócio já espalhou a notícia e sua vergonha só faz aumentar... Me diga, com toda sinceridade, não seria mais fácil assumir a "primeira vergonha"? (coloco entre aspas porque não acho que uma falência seja sinônimo de incapacidade, são tantas as variáveis a serem cuidadas, que a vergonha não pode vir daquilo que não temos o controle. Talvez de um erro que eu cometa pela segunda vez, mas não tenho vergonha de erro primeiro, pois errar faz parte do aprendizado. Acredito que quem não erra, não se expõe ao aprendizado, só fica no campo teórico). Percebe que nessa situação o fracasso só aumenta o seu peso, enquanto você não o encara, de fato? Nesta situação, o desagradável é inevitável, pois a falência sempre gera perdas, mesmo que não chegue a ferir sua autoestima.  Pois vamos adiante. 

B- Aceitando que você está sofrendo por conta do "fracasso", você pode chegar a pensar: quais falhas minhas contribuíram para a falência? quais elementos estão fora de meu controle (Contextos econômicos locais, nacionais e internacionais)? Existe a possibilidade de alguém ter realizado alguma ação com a intenção de prejudicar  o negócio? Como se defender ou dar limite, sem essa reflexão? Essa parte do movimento significa conhecer as partes do todo que representa o desagradável, só podemos lidar de forma consciente com aquilo que conhecemos o suficiente para. 

C- Conhecendo os fatores que levaram o negócio à falência, no próximo você já pode reconhecer como fazer um planejamento mais eficiente e de acordo com os fatores que saem do seu controle, como escolher pessoas que você possa confiar mais e conviver melhor, como não repetir o erro e se a falência chegou a ferir sua autoestima, você tenha se sentido incapaz de gerir seu negócio, você pode resgatar a confiança em reconhecendo que o negócio não era algo que te trazia realização e, por isso, você muda de ramo ou simplesmente você abre o mesmo negócio e muda, para melhor, a forma de geri-lo. O que te traz mais prazer ao exercer sua atividade. 

D- Esse ultimo passo daquilo que significa o "movimento de lidar com o desagradável" é de reconhecer que não é possível e , muito menos, justo conviver com "o desagradável" se esse "desagradável" é um abuso. No nosso exemplo, podemos falar da pessoa que fez algo com intenção de prejudicar, com a intenção de causar a falência. Primeiro, quem precisa ter vergonha é quem não foi ético, quem não pensou no coletivo, quem quer ter sucesso a partir do prejuízo do outro. A vergonha vem aí como uma punição social para aquilo que não converge para o bem estar social. Então, não assuma essa vergonha para si e tome as providências para que essa pessoa não volte a repetir essa atitude contra você e contra outras pessoas. Muitas vezes a vergonha não é o suficiente ou não chega a acontecer, principalmente quando os valores estão atrelados ao "ter mais" em detrimento do "ser ético".  Com abuso não se convive, lide com ele o suficiente para ficar longe dele. 

        Leia e releia os passos, para chegarmos com clareza a reflexão final, que é a mais perigosa do contato com a Filosofia do Yoga, no que tange ao CONTENTAMENTO : 

"- Quando um homem , ó Partha, expulsa de seu espirito todos os desejos, e satisfaz-se em si mesmo pelo seu próprio ser, diz-se que está firme em sua compreensão.
- Aquele cujo o espírito não vacila na adversidade, que não procura agarrar-se  aos prazeres, aquele a quem abandonaram a atração, o medo e a cólera, é o sábio que está firme em sua compreensão.
- Aquele que não é afetado por coisa alguma, boa ou má, e não odeia e não regozija, sua sabedoria está solidamente estabelecida. 
- Quando o Yoguin não mais está à mercê das ondas de emoção que o excitam ou o deprimem, quando se mantém acima das alterações e mudanças exteriores e pode conservar um equilíbrio interior em meio a golpes e imprevistos da vida, ele alcançou a equanimidade absolutamente indispensável para atravessar ileso e vitorioso todos os obstáculos que se levantarem sobre seu caminho" ( Tara Michael).  

      Podemos cair na interpretação de que é possível o controle total sob as emoções, pensamentos ou situações, mas quando aprofundamos o conhecimento, o que acontece é a interpretação de que os extremos nos aprisionam, deixar-se levar pela tristeza, sem tentar compreende-la, digeri-la e canalizá-la (lidar com ela) para alguma ação necessária para sair dela ou pela euforia, que esgota nossa energia e não traz com ela a consciência de que a alegria é passageira.  

Trazendo nosso exemplo do texto, significa dizer que diante do sucesso e da falência, existe a compreensão de que ambas tem a mesma probabilidade de acontecer e que o aprendizado é uma compreensão que está acima das duas, o foco no aprendizado nos faz não valorizar demais nem o sucesso, nem o fracasso, faz sentido? Esse é o sentido de contentamento, é a atitude equânime diante daquilo que dá prazer e aquilo que é desagradável, dando-lhes o mesmo peso nas experiências vividas, ambos com sua importância e respeitando os seus limites para a lide com eles. 

O termômetro é sempre interno, ou seja, antes de dizer "o que vão falar sobre isso", 
fale: "o que eu acho sobre isso". 

Abraço grande de Sófi. 


Citações:

Pedro Kupfer: A Positividade Tóxica. Disponível em: https://www.yoga.pro.br/a-positividade-toxica-no-yoga/. 

Tara Michel: O Yoga. Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1975. 


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